quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A Beleza Interior por Suellen Andrade(SP)

Desde pequena sempre fui muito interessada em ler e escrever, nunca tive livros, pois meus pais não tinham condições de comprá-los. Então me divertia com os livros de português, história e geografia dados pela escola. Adorava ler as histórias dos livros e fazer os exercícios propostos neles. O mais engraçado era que sempre era a primeira da sala a estar com a lição pronta. Eu também adorava inventar histórias de castelos e princesas, fazer desenhos muito coloridos com princesas de cabelos cacheados, pois nos contos de fada nenhuma tinha cabelos cacheados como os meus. Lembro-me que na segunda série recebi um livro de português, que continha várias histórias, contos e fábulas. Eu os lia assim que chegava em casa. Foi através do contato que tenho com as crianças deficientes visuais que me lembrei desta história, não me recordo o nome nem o autor, mas vou relatar o que lembro.A história falava de um pavão que ficava se gabando de sua beleza e menosprezando os outros animais do zoológico. Ele dizia a todos que as crianças se encantavam com as suas plumagens e que ele era perfeito. Todos os animais do zoológico se sentiam feios com o que o pavão dizia, até que um belo dia surge no zoológico um novo animal. Era uma arara azul e suas plumas eram de um azul tão lindo. A arara não se gabava de sua beleza e logo se tornou amiga de todos os animais, mas o pavão morrendo de inveja foi lá tomar satisfação com a arara e disse: – Você não deve se misturar com esses animais feios. A arara muito brava respondeu: – Mas somos todos bonitos, cada um com a sua beleza e cada um com seus defeitos também. – Imagina! Eu sou perfeito, olhe as minhas plumas, são as mais lindas do mundo – disse o pavão abrindo elegantemente suas plumas. – Realmente, são lindas suas plumas, mas você já observou suas patas? Olhe para elas, veja como são enrugadas, e estas unhas que horríveis – disse a arara. E todos os animais caíram na gargalhada. A arara mostrou a todos que o que vale realmente não é nossa aparência, mas sim o que somos por dentro, e o que é mais valioso é a nossa beleza interior. O que me fez lembrar dessa história foi uma menina linda que se chama Helloá. Ela é cega congênita, e como no Brasil não são muitos os livros que são transcritos em Braille nós visitamos algumas escolas ou entidades, escolhemos alguns livros para lermos para as crianças e, além da leitura, buscamos objetos e algumas texturas para as crianças tocarem e terem a percepção de como é o personagem ou algum objeto descrito na leitura que estamos fazendo a elas. Nesse dia escolhemos uma história chamada “O livro que queria ser brinquedo”, de Sandra Aymone, e junto levamos alguns personagens do livro, o livro de capa dura, a bola, a pipa, a bóia, o caminhãozinho, os cubinhos de madeira e até um cacto de verdade. Em determinado momento estou eu tomando o maior cuidado com o cacto e colocando a mão da Helloá bem devagar para ela não se machucar com os espinhos da planta, e então ela me disse: – Tia Su, você é tão linda! E a minha reação foi responder: – A tia nem se arrumou direito hoje. Então ela disse: – Tia Su esqueceu que eu enxergo diferente de você? A minha visão vai além da sua, pois eu enxergo aqui! Neste momento ela colocou a mãozinha em meu peito, indicando que enxerga o meu coração. Foi então que me lembrei que a beleza mais importante é a beleza interior. Cheguei em minha casa nesse dia com uma visão totalmente diferente do mundo. Fiquei pensando no que a pequena Helloá havia me dito, como pode uma menina de sete anos me dar uma lição tão valiosa como essa? Foi então que decidi relatar sobre a leitura que mexeu com a minha cabeça, para que outras pessoas recebam a mensagem de uma menina cega que enxerga muito além do que os nossos olhos podem ver

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